Um tempo marcante*
Ora necessito pensar e rever se ainda
existem sonhos, ainda existem utopias, se 2020 da forma com se apresentou não apagou,
não riscou para sempre essas dimensões.
Talvez meu olhar sobre 2020 possui
uma marca angustiante, desafiante, desintegrador, desencantador. Um olhar, com
olhar e impressão de muitos.
Nessa dimensão o tempo passou e nada
mudou... nada mudou! Mas se mudou o que mudou! Naquilo que quero acreditar ou
no que mudou de fato de nossas externalidades, nossas interioridades, de nossas
objetividades de nossas subjetividades.
Nesse ambiente nos encontramos, de
continuidade pandêmica que assola o mundo. Os números são impressionantes, são
preocupantes. Nossa apreensão de mundo vai até a notícia de quem fazia parte
dele já não está mais conosco. Como uma peça de um quebra cabeças que não
existe mais e que não irá compor a mesma imagem. Agora os desafios estão postos
de refazer novas imagens com as peças que temos com as que restaram.
Mãos trêmulas, olhar míope, dúvidas
me cercam. É o que tenho no momento, recompondo o corpo, juntando os pedaços,
equilibrando a mente em seu componente cerebral para estimular setores do mesmo
que não foram estimulados.
Se nada ficou em minha experiência
humana nesse único e incalculável experimento que passamos. Se não escondemos a
dor que vivemos, a incerteza nos fortaleceu ou nos acovardou?
Acredito no fortalecimento, mesmo
diante da escuridão e das incertezas, pois quer queiramos, quer não, temos que
continuar, temos que aprofundar o nosso melhor, daquilo que sabemos pensar,
sabemos fazer, sabemos viver. Talvez esse pensar, esse fazer, esse viver seja
traçado com maior profundidade, equilíbrio, aberto as novas concepções que
estão aparecendo e aparecerão.
Talvez, num primeiro momento, não
identificaremos como novas concepções, pois delas nada conhecemos nada sabemos.
Se soubermos, elas não são novas, são fatos encobertos pela película do
novo. E estas tem força de apresentar-se
com realidade ilusória que nos envolve nos atrai, nos contamina, nos engana.
Talvez tarde seja, porém ainda há tempo, de superar esta falta de
autenticidade, pela aparência do engodo repetitivo de uma derme enfeitiçada apresentando-se
como camaleão.
Nesse ambiente posso fertilizar
dimensões esperançosas?
Penso que sim. Porém será laboriosa
essa reconstrução, pois velhos materiais estão aí postos como os únicos para a
edificação. Necessitamos definir, no caminhar, estes novos formatos e dispensar
materiais antigos e utilizar outros materiais e criar e inovar outros tantos.
Assim podemos, assim caminhamos, sem um destino definido, porém, com
experiências da condição humana que nos conduziu até aqui definidas pela razão,
agora acompanhada pela sensibilidade de um coração que sangra que foi e é marca
de nossa espécie.
*Paulo Bassani é
filósofo e sociólogo

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