Tarefa difícil e complexa*
O
intelectual é um ser pensante, que não
deveria estar preso a esta ou aquela teoria, este ou aquele autor, este ou
aquele partido político, esta ou aquela religião, mas ter em seu cérebro, seus
estudos, capacidades de articular um conjunto enorme de explicações que obteve
ao longo da história e de suas reflexões e análises e, esta não é uma tarefa
fácil. Exige leitura, concentração, dedicação, tempo, discernimento, distanciamentos
e aproximações. A essência de um intelectual é de que ele transcenda as ideias
rasas de seu tempo, lembrando que as preocupações comuns do cotidiano, já fazem
parte de suas análises. No entanto, atento, não deixa de entender o espírito de
sua época diante do que é esclarecedor e o que é obscurantismo, do que é
evidente e do que se esconde.
O que o intelectual tenta é demonstrar no
pensamento, as questões gerais, as questões amplas, com um olhar mais profundo,
para tanto busca sempre que necessário, incorporar as experiências que ocorrem em nosso tempo, em nosso
cotidiano. Isso significa estar atento as questões globais quanto às questões
locais. Quando ouve, lê uma notícia não
emite uma opinião rápida, simples, rasa. É prudente parar para pensar,
verificar a veracidade, a origem, como ela se expressa, por quem e de que forma
foi elaborada. Isso implica checar a fonte da informação para efetivar a credibilidade no processo de análise.
É comum estabelecer uma relação contextual, ampliando suas correlações,
para depois estabelecer uma análise com maior fecundidade. É, necessariamente,
um defensor da liberdade de expressão em suas manifestações filosóficas,
artísticas, culturais e científicas. É muito complexo o livre pensar numa
sociedade onde as narrativas carregam uma cegueira sobre falas e experiências
que acreditam serem absolutas, ou são estas, ou nada são. Principalmente quando
estas narrativas surgem de um contexto político complexo, porém de pura
experimentação de algo que acredita ser a expressão única, hegemônica.
Talvez, seja um bom momento para a
desconstrução, demolição das formas convencionais para, no montante de resíduos
resultantes, verificar as possibilidade de aproveitamento de parte deles, selecionando-os
atribuindo uma ressignificação sob a forma do novo. Agora, não bastam esses
resíduos, necessitamos de outros materiais. No entanto, esses, se manifestam nos
processos visíveis e invisíveis que ocorrem pelos recantos de uma realidade líquida,
perversa. E aí há muito trabalho de análise, muito trabalho para explicar o
curso que as coisas estão assumindo. Uma série de questões entram em cena,
necessitamos cautela para enfrentá-las, necessitamos de boas cabeças para
problematizar e analisar, afim de, criticamente construir e reconstruir
permanentemente o pensamento. Temos que, como uma tribo de pessoas críticas e
sensíveis ao pensar, ir ao encontro da esperança, da utopia que sonhamos e
desejamos. Precisamos aprender sobre a natureza que é a mãe de tudo, para
compreendermos mais e melhor a nossa própria natureza, e entender-se melhor
como ser humano, com nossos propósitos, nossas tarefas, nossas missões. Mesmo
que ainda não tenhamos identificadas, mas elas estão por aí em algum lugar.
E, quem sabe, o fruto dessa compreensão,
processo do pensar, dessa codificação, possa surgir às novas formas para
estabelecer dinâmicas que sejam orientadas por outras lógicas,
horizontalizadas, conscientes, emancipadas. Não há caminho para a sustentabilidade
sem uma educação emancipada e crítica, com formação e capacitação de pessoas
que possam compreender o significado e a natureza deste modelo embrionário. São
princípios e valores que remetem a história de um novo tempo para pensá-lo e
fazê-lo não apenas diferente, mas transformado. A fim de buscarmos as respostas
e formas seguras, consistentes, precisamos conhecer melhor o chão onde elas
ocorrem. Isso implica em conhecer e saber o que fazer, e no percurso deste
conhecimento orientar nossas ações.
Hoje há milhões de brasileiros que
perderam o trem. Ficaram na estação ou foram abandonados no percurso. Esse trem
do crescimento, do progresso, do desenvolvimentismo não para de se manifestar e,
a cada dia, deixa mais pessoas pelo caminho. Os intelectuais, pensadores, não
podem negar esta realidade. Deverão estimular as transformações que elevem
todos os sujeitos a um envolvimento necessário, dos contatos entre seres com
seus direitos cidadãs garantidos para compor o ambiente de dignidade e
qualidade, inicialmente do território onde vivem e na seqüência de sua
amplitude universal. Porque temos esta tarefa: pensar e propiciar, como fruto
desse pensamento, coisas boas coisas que emancipam os seres humanos a outro
estágio civilizatório.
*Paulo Bassani é Sociólogo e Professor Universitário
Folha de Londrina - Espaço
Aberto - Pág.
02, Londrina – PR – 27/12/2021
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