ESPECIAL da Folha de Londrina - UEL – 50 anos
Um indiano do mundo que criou raízes em Londrina
Professor de Comunicação inovou ao debater
globalização no início
dos anos 80, em Londrina
Quando
pouco se falava sobre globalização, o professor Eduardo Judas Barros já
abordava o assunto nos cursos de Jornalismo e Relações Públicas e em eventos
organizados na UEL, em meados dos anos 80. Por 25 anos, ele atuou na
Universidade e deixou um legado sobre estudos do terceiro mundo, com foco na
divulgação da cultura dos países da África e da Ásia.
O verbo
conjugado no passado indica uma perda repentina, em julho de 2008, de uma
figura marcante no modo de falar, de se vestir e se relacionar, que expressavam
de forma autêntica sua origem.
Barros
nasceu na Índia, em 21 de janeiro de 1944, na província de Goa, uma colônia
portuguesa. Deixou o país para fazer Doutorado no Brasil na década de 70. “Um
indiano, viajante do mundo, que resolveu fincar raízes em Londrina”, é assim
que o professor aposentado do Departamento de Ciências Sociais da UEL, Paulo
Bassani, considerava o amigo.
As raízes
desse homem das Relações Públicas se transformaram em árvores robustas e deram
frutos para a Universidade, para a cidade, para a profissão e para as pesquisas
do mundo acadêmico, com impacto em diversos países.
AS PEGADAS PELO CAMINHO
A
chegada à UEL foi em 1983, para lecionar no Departamento de Comunicação, no
Centro de Educação, Comunicação e Artes (CECA). Ética Profissional, Comunicação
e Cultura, e Teoria da Comunicação foram algumas das disciplinas ministradas
para os cursos de Jornalismo e Relações Públicas.
Com
apenas dois anos de casa, ele criou o Núcleo de Estudos Afro-Asiáticos (NEAA) -
hoje Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros (NEAB) - que abriu portas para
globalização e para as culturas africana e asiática na Universidade. O Ato
Executivo nº 764/85 foi assinado pelo reitor à época, Marco Antônio Fiori, em
13 de junho de 1985. A partir de então, Barros passou a dividir a carga horária
de trabalho entre as aulas no Departamento e as atividades no Núcleo.
Por
meio do Simpósio sobre Comunicação e Cultura no Terceiro Mundo, realizado a
partir de 1992 pelo NEAA, a UEL recebeu personalidades conhecidas
nacionalmente, como os jornalistas Boris Casoy e José Simão, ambos da Folha de
S. Paulo, e reconhecidas no mundo acadêmico, como o geógrafo e professor Milton
Santos.
Embaixadores
da Índia, do Líbano e da Síria também participaram dos eventos, como lembra o
colega de Departamento de Jornalismo da UEL, professor Ayoub Hanna Ayoub. Numa
das oportunidades, ele e a mãe, de origem libanesa, foram convidados para um
jantar com o embaixador do país. “Foram eventos que mobilizaram a colônia árabe
de Londrina”, relembra.
Tanto
o Campus, quanto o Teatro Ouro Verde, foram palco de espetáculos internacionais
de música e dança dos países da África e Ásia, além de exposições fotográficas,
congressos, simpósios, debates e conferências sobre o terceiro mundo. Tudo isso
a partir da relação do NEAA com a Associação Latino Americana de Estudos Afro
Asiáticos no Brasil, da qual o professor da UEL foi presidente por seis anos.
Barros
esteve na direção do Núcleo até 2004, mas as atividades não pararam. Como
titular da Assessoria de Relações Internacionais (ARI) da UEL, diversos eventos
culturais continuaram a ser promovidos na cidade, como os festivais de dança
árabe e do folclore internacional.
Eduardo Judas Barros tinha contato com professores e
personalidades de diversas partes do mundo, incluindo o próprio país de origem
e a Inglaterra. A relação exterior, com países da América Latina, possibilitou
a criação da Associação Latino Americana de Relações Públicas (ALARP), da qual
foi um dos fundadores e presidente.
Na cidade, como recorda Paulo Bassani, o amigo transitava dos
movimentos populares até as sociedades civis organizadas, como Associação
Comercial e Industrial de Londrina (ACIL) e Sociedade Rural. O destaque das
suas ações o levou ao cargo de diretor do Departamento de Cultura, na segunda
gestão do prefeito Antonio Belinati.
“Ele participava de muita coisa, viajava muito, publicava muito.
Tinha um lado proativo”, afirma Bassani, que considera ainda que esse jeito do
amigo fazia algumas pessoas gostarem dele e outras não. “Entre os prós e os
contras, os prós se sobressaem”, defende. Todas essas relações foram
acompanhadas de perto em mais de 10 anos de amizade, que começou em um dos
eventos organizados pelo NEAA.
Atualizado pela última vez em abril de 2008, três meses antes do
falecimento, o currículo lattes de Eduardo Judas Barros é extenso. São dois
mestrados, dois doutorados, diversas participações e organizações em eventos
nacionais e internacionais, além de publicações.
O caminho percorrido antes da chegada ao Brasil inclui formação
em Filosofia Social, seguida de especialização em Jornalismo e de dois
mestrados: em Sociologia e em Filosofia Social. Já os dois doutorados foram na
Universidade de São Paulo (USP), em Ciência Social e Ciências da Comunicação. A
vinda, nos anos 70, foi possível porque ele pleiteou uma bolsa de estudo, junto
à embaixada, para fazer o doutorado na capital paulista.
Antes de dar aulas em Londrina, foi professor na Fundação Escola
de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP) e na Universidade Estadual
Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP). A última atuação na UEL foi como
assessor na Assessoria de Relações Internacionais (ARI), de 2006 até o
falecimento.
A PARTIDA REPENTINA
Bassani foi o primeiro a chegar à UTI do Hospital Evangélico
naquele dia 25 de julho de 2008, logo após o falecimento do amigo por
agravamento de problemas cardiorrespiratórios e falência múltipla dos órgãos. A
reação foi a das mais inesperadas. Disse: “Barros, que isso? Levanta daí!”.
Tocou na perna do amigo e o corpo já estava gelado. Ele conta que era difícil
de acreditar, porque cinco dias antes estavam reunidos.
Os dois trocavam livros sobre os temas que conversavam e
estudavam. “Não devolvi dois livros dele e acho que dois meus ficaram na casa
dele”, relembra Bassani, que além das boas lembranças, guarda o material que
pertenceu ao amigo. Barros tinha uma biblioteca extensa em sua casa e grande
parte dela foi doada ao NEAA, em agosto de 2008.
O professor Ayoub Hanna Ayoub conta que um culto ecumênico foi
realizado no Campus da UEL, pelo 7º dia de falecimento, e reuniu muitas pessoas
conhecidas. A cerimônia foi celebrada pelo padre Joaquim, também nascido em
Goa, na Índia, com participação de representantes do islamismo e da umbanda.
“Ele era eclético em muitos sentidos, principalmente do ponto de vista da
religião”, conta.
A lembrança e o reconhecimento ao trabalho desenvolvido veio por
meio de uma homenagem póstuma. Em 2009, a Associação Latino Americana de
Relações Públicas (ALARP) instituiu o Prêmio “Prof. Eduardo Judas Barros”. Pela
atuação, o professor Eduardo Judas Barros deixa o nome registrado na História -
boa parte dentro nos 50 anos da UEL. Ele fez seu papel de viajante: marcou o
caminho e partiu para outra jornada.
Nenhum comentário:
Postar um comentário