2 de outubro de 2021



 Minha Homenagem aos 50 anos de UEL e ao Prof. Dr. Eduardo Judas Barros, meu amigo que nos deixou em 2008

ESPECIAL da Folha de Londrina - UEL – 50 anos

Um indiano do mundo que criou raízes em Londrina

Professor de Comunicação inovou ao debater globalização no início dos anos 80, em Londrina 

 Por  Beatriz Botelho 

Quando pouco se falava sobre globalização, o professor Eduardo Judas Barros já abordava o assunto nos cursos de Jornalismo e Relações Públicas e em eventos organizados na UEL, em meados dos anos 80. Por 25 anos, ele atuou na Universidade e deixou um legado sobre estudos do terceiro mundo, com foco na divulgação da cultura dos países da África e da Ásia.

O verbo conjugado no passado indica uma perda repentina, em julho de 2008, de uma figura marcante no modo de falar, de se vestir e se relacionar, que expressavam de forma autêntica sua origem.

 Barros nasceu na Índia, em 21 de janeiro de 1944, na província de Goa, uma colônia portuguesa. Deixou o país para fazer Doutorado no Brasil na década de 70. “Um indiano, viajante do mundo, que resolveu fincar raízes em Londrina”, é assim que o professor aposentado do Departamento de Ciências Sociais da UEL, Paulo Bassani, considerava o amigo.

As raízes desse homem das Relações Públicas se transformaram em árvores robustas e deram frutos para a Universidade, para a cidade, para a profissão e para as pesquisas do mundo acadêmico, com impacto em diversos países. 

AS PEGADAS PELO CAMINHO

A chegada à UEL foi em 1983, para lecionar no Departamento de Comunicação, no Centro de Educação, Comunicação e Artes (CECA). Ética Profissional, Comunicação e Cultura, e Teoria da Comunicação foram algumas das disciplinas ministradas para os cursos de Jornalismo e Relações Públicas.

Com apenas dois anos de casa, ele criou o Núcleo de Estudos Afro-Asiáticos (NEAA) - hoje Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros (NEAB) - que abriu portas para globalização e para as culturas africana e asiática na Universidade. O Ato Executivo nº 764/85 foi assinado pelo reitor à época, Marco Antônio Fiori, em 13 de junho de 1985. A partir de então, Barros passou a dividir a carga horária de trabalho entre as aulas no Departamento e as atividades no Núcleo. 

Por meio do Simpósio sobre Comunicação e Cultura no Terceiro Mundo, realizado a partir de 1992 pelo NEAA, a UEL recebeu personalidades conhecidas nacionalmente, como os jornalistas Boris Casoy e José Simão, ambos da Folha de S. Paulo, e reconhecidas no mundo acadêmico, como o geógrafo e professor Milton Santos. 

Embaixadores da Índia, do Líbano e da Síria também participaram dos eventos, como lembra o colega de Departamento de Jornalismo da UEL, professor Ayoub Hanna Ayoub. Numa das oportunidades, ele e a mãe, de origem libanesa, foram convidados para um jantar com o embaixador do país. “Foram eventos que mobilizaram a colônia árabe de Londrina”, relembra. 

Tanto o Campus, quanto o Teatro Ouro Verde, foram palco de espetáculos internacionais de música e dança dos países da África e Ásia, além de exposições fotográficas, congressos, simpósios, debates e conferências sobre o terceiro mundo. Tudo isso a partir da relação do NEAA com a Associação Latino Americana de Estudos Afro Asiáticos no Brasil, da qual o professor da UEL foi presidente por seis anos.

Barros esteve na direção do Núcleo até 2004, mas as atividades não pararam. Como titular da Assessoria de Relações Internacionais (ARI) da UEL, diversos eventos culturais continuaram a ser promovidos na cidade, como os festivais de dança árabe e do folclore internacional.

Eduardo Judas Barros tinha contato com professores e personalidades de diversas partes do mundo, incluindo o próprio país de origem e a Inglaterra. A relação exterior, com países da América Latina, possibilitou a criação da Associação Latino Americana de Relações Públicas (ALARP), da qual foi um dos fundadores e presidente. 

Na cidade, como recorda Paulo Bassani, o amigo transitava dos movimentos populares até as sociedades civis organizadas, como Associação Comercial e Industrial de Londrina (ACIL) e Sociedade Rural. O destaque das suas ações o levou ao cargo de diretor do Departamento de Cultura, na segunda gestão do prefeito Antonio Belinati.

“Ele participava de muita coisa, viajava muito, publicava muito. Tinha um lado proativo”, afirma Bassani, que considera ainda que esse jeito do amigo fazia algumas pessoas gostarem dele e outras não. “Entre os prós e os contras, os prós se sobressaem”, defende. Todas essas relações foram acompanhadas de perto em mais de 10 anos de amizade, que começou em um dos eventos organizados pelo NEAA.

Atualizado pela última vez em abril de 2008, três meses antes do falecimento, o currículo lattes de Eduardo Judas Barros é extenso. São dois mestrados, dois doutorados, diversas participações e organizações em eventos nacionais e internacionais, além de publicações. 

O caminho percorrido antes da chegada ao Brasil inclui formação em Filosofia Social, seguida de especialização em Jornalismo e de dois mestrados: em Sociologia e em Filosofia Social. Já os dois doutorados foram na Universidade de São Paulo (USP), em Ciência Social e Ciências da Comunicação. A vinda, nos anos 70, foi possível porque ele pleiteou uma bolsa de estudo, junto à embaixada, para fazer o doutorado na capital paulista. 

Antes de dar aulas em Londrina, foi professor na Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP) e na Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP). A última atuação na UEL foi como assessor na Assessoria de Relações Internacionais (ARI), de 2006 até o falecimento. 

A PARTIDA REPENTINA

Bassani foi o primeiro a chegar à UTI do Hospital Evangélico naquele dia 25 de julho de 2008, logo após o falecimento do amigo por agravamento de problemas cardiorrespiratórios e falência múltipla dos órgãos. A reação foi a das mais inesperadas. Disse: “Barros, que isso? Levanta daí!”. Tocou na perna do amigo e o corpo já estava gelado. Ele conta que era difícil de acreditar, porque cinco dias antes estavam reunidos.

Os dois trocavam livros sobre os temas que conversavam e estudavam. “Não devolvi dois livros dele e acho que dois meus ficaram na casa dele”, relembra Bassani, que além das boas lembranças, guarda o material que pertenceu ao amigo. Barros tinha uma biblioteca extensa em sua casa e grande parte dela foi doada ao NEAA, em agosto de 2008.

O professor Ayoub Hanna Ayoub conta que um culto ecumênico foi realizado no Campus da UEL, pelo 7º dia de falecimento, e reuniu muitas pessoas conhecidas. A cerimônia foi celebrada pelo padre Joaquim, também nascido em Goa, na Índia, com participação de representantes do islamismo e da umbanda. “Ele era eclético em muitos sentidos, principalmente do ponto de vista da religião”, conta.

A lembrança e o reconhecimento ao trabalho desenvolvido veio por meio de uma homenagem póstuma. Em 2009, a Associação Latino Americana de Relações Públicas (ALARP) instituiu o Prêmio “Prof. Eduardo Judas Barros”. Pela atuação, o professor Eduardo Judas Barros deixa o nome registrado na História - boa parte dentro nos 50 anos da UEL. Ele fez seu papel de viajante: marcou o caminho e partiu para outra jornada.

Nenhum comentário:

Postar um comentário